Desprezadas por Bolsonaro, mulheres negras são o grupo mais vulnerável ao desemp
Taxas de desemprego apresentam dados diferentes de acordo com etnia, gênero e classe social /
Publicado: 06 Novembro, 2018 - 12h42 | Última modificação: 06 Novembro, 2018 - 12h47
Escrito por: Luciana Console Brasil de Fato
ovens e mulheres negras são os grupos sociais mais vulneráveis ao desemprego no Brasil. A informação, lançada na última quarta-feira (31), foi levantada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e publicada no Boletim de Mercado de Trabalho nº 65. O estudo mostra que a cada ponto percentual de elevação na taxa geral de desemprego, as mulheres negras sofrem aumento de 1,5 ponto percentual. No caso das mulheres brancas, o valor é de 1,3 ponto percentual.
Para Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), as informações nada mais são do que um reflexo da formação da sociedade brasileira.
"Essa estrutura do mercado de trabalho, de alguma forma, reflete as estruturas de desigualdade socioeconômicas presentes na sociedade brasileira. São desigualdades do ponto de vista da renda, do patrimônio, da condição cultural, do acesso à educação. Essa desigualdade, que perpassa a sociedade como um todo, acaba repercutindo no mercado de trabalho e na sua dinâmica".
O especialista se refere à eliminação de postos de trabalho mais frágeis nos momentos de crise, fenômeno que atinge principalmente os grupos mais vulneráveis. De acordo com ele, as mulheres negras encontram-se neste grupo justamente por serem a maioria das trabalhadoras em ocupações mais precárias, como o trabalho doméstico, por exemplo. Lúcio acrescenta que a profissão só foi amparada pela legislação brasileira com a aprovação da "PEC das Domésticas" em 2013 – a qual o então deputado federal Jair Bolsonaro (PSL) se opôs.
Para a integrante do Movimento Negro, Luka Franca, a aplicação da medida foi uma conquista importante para a população negra. Ela também aponta que as responsabilidades familiares, atribuídas à maioria dessas mulheres no Brasil, é um obstáculo a mais para se manter no emprego.
"A gente vê uma dificuldade gigantesca do mercado de conseguir absorver uma mão de obra que, muitas vezes, precisa de tempo para cuidar da sua família, dar conta do trabalho reprodutivo dentro das casas, e muitas vezes é vista como mais onerosa".
Nesse sentido, a militante ressalta a importância de políticas públicas de trabalho e renda que acolham as particularidades dessa parcela significativa da classe trabalhadora, como creches em tempo integral e redução da jornada, por exemplo.
Diante da necessidade urgente de se reafirmar os direitos das mulheres negras, a eleição de Bolsonaro causa preocupação. O futuro presidente é conhecido pelas declarações racistas, machistas e homofóbicas, o que demonstra desprezo e falta de empatia com certos setores da classe trabalhadora. Na interpretação de Luka, as propostas para o próximo governo seguem essa tendência.
"O que ele apresenta, primeiro, é uma grande colcha de retalhos de um pensamento nacionalista, com abertura neoliberal e uma série de outras coisas que não vai assegurar direitos, efetivamente".
Além da alta taxa de vulnerabilidade das mulheres negras, quando o assunto é desemprego, a pesquisa também mostra que, entre o terceiro trimestre de 2014 e o primeiro trimestre de 2017, o desemprego entre os jovens de 18 e 29 anos subiu 10,6 pontos percentuais. Os jovens com ensino médio incompleto são ainda mais vulneráveis.
Lúcio explica que os empregadores procuram manter a força de trabalho mais qualificada quando há restrição no mercado de trabalho, e os jovens acabam sendo excluídos pela falta de experiência.
O crescimento econômico poderia ajudar a reverter esse quadro. Nesse caso, as taxas de desemprego gerais diminuiriam e a sociedade como um todo sairia beneficiada. Porém, ainda assim, a análise por grupo social demonstra que é preciso ações afirmativas específicas para determinadas parcelas da população. Por isso mesmo, o especialista ressalta que o papel do Estado é fundamental.
"Para enfrentar um problema estrutural de desigualdade, [a solução] são políticas afirmativas de médio e longo prazo. Seja de investimento em educação, seja de garantir as cotas de acesso aos negros na universidades".
Luka Franca ressalta que pesquisas sobre taxas de desemprego são um indicativo importante para se entender a formação da classe trabalhadora no Brasil e com base nisso, elaborar políticas de mudança e melhoria. Para ela, os debates não podem ser dissociados de raça e gênero, e os resultados da pesquisa do Ipea apenas comprovam essa tese.